3.1 BAARAZNAU90 WAPICHAN ‘OS
CAMPOS WAPIXANA’
Bernard Pottier, em sua obra Le Domaine de
l’Ethnolinguistique (1970, p. 3) já notava que
o estudo das taxionomias lexicais91 é
via privilegiada para a compreensão da língua e a visão de mundo do grupo
estudado. A partir dessa perspectiva, iremos aqui explorar as taxionomias das
paisagens vegetais dos Wapixana, inserindo um novo dado aos mapas da RISeL,
segundo a visão de mundo Wapixana.
Antes, dizem os Wapixana, só havia dia e uma grande
árvore, ‘tamoromu’. Todo alimento estava lá, não precisava
plantar era só colher. Só que a árvore era bastante alta e havia muita
quantidade e diversidade de alimentos nesta árvore: mandioca, amendoim, banana,
milho, arroz, abóbora, cará, feijão, inhame, melancia, tudo na mesma grande
árvore. No entanto, para alcançar os
alimentos era necessário subir nesta, atividade que era muito penoso. Então,
dois irmãos resolveram cortar tamoromu, ‘a grande
árvore’, para facilitar a colheita
dos alimentos, assim como, retirar as suas sementes. A
árvore tombou, como resultado, o céu também despencou, o que era dia,
tornou-se noite. Onde caiu
mandioca, milho, abóbora... virou roça,
‘zakap’;
onde caiu
folhas e galhos virou floresta, ‘kanuku’; e onde não
caiu nada virou campo, ‘baaraz’92.
Este mito consta na memória coletiva dos Wapixana e
povos adjacentes, como os Makuxi. O próprio monte Roraima é considerado como o
tronco desta grande árvore que foi derrubada
pelos irmãos arteiros, resquícios de uma geografia mítica
na atual TI Raposa/Serra do Sol. Os Wapixana, nesta
geografia totêmica93,
ficaram no campo,
baaraz, ou
melhor, nos campos,
baaraznau, visto que são diversos.
Outra versão mítica das paisagens campestres Wapixana
refere-se também à morte, agora de um
grande animal:
Contam que os paraiunan,
[Paraviana], uma tribo de gente que corria muito, muito rápida mesmo,
respeitavam muito um bicho. Esse bicho era como uma onça, bem grande, morava
para baixo e não tinha o lavrado
ainda. Esses índios
resolveram matar o bicho e o flecharam e cortavam o bicho
enquanto este corria. Onde caia os pedaços do bicho, as matas se transformavam
em campo, lago, igarapé, tudo bem perto do outro. (informação verbal)9
FONTE João
Paulo Jeannine Andrade Carneiro
A Morada dos Wapixana
Atlas
Toponímico da Região Indígena da Serra da Lua – RR
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